Inflação atinge 7,2% e devora meta do governo; 64% dos preços sobem
No acumulado dos últimos 12 meses, o custo de vida medido pelo IPCA, indicador usado como referência oficial para calcular a inflação, chegou a 7,23%, estourando o teto previsto pelo Banco Central, que é de 6,5%. A alta nesse período é maior desde junho de 2005, quando bateu em 7,27%.
Segundo o IBGE, em agosto, 64% dos produtos e serviços registraram aumento. Os alimentos foram os que mais pesaram no bolso, seguidos de álcool, aluguel e roupas femininas. Na TV, a preocupação com a economia e com a crise financeira internacional abriu o pronunciamento da presidente Dilma alusivo ao Sete de Setembro. “O país está plenamente preparado para enfrentar mais esse desafio”, disse.
A inflação não tem dado trégua aos brasileiros. Em agosto, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), usado como referência para o sistema de metas do governo, subiu 0,37%, mais do que dobrando em relação a julho (0,16%). A carestia se disseminou de uma tal forma que 64% de todos os produtos e serviços acompanhados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) registraram reajustes.
No acumulado de 12 meses, o custo de vida cravou elevação de 7,23%, estourando, em muito, o teto da meta perseguida pelo Banco Central, de 6,5%. A alta no período foi a maior desde junho de 2005, quando o indicador havia ficado em 7,27%. Diante disso, os principais economistas do país revisaram as projeções e apostam que o IPCA deste ano ficará acima do limite tolerável, posição reforçada pela decisão do BC de cortar a taxa básica de juros (Selic) em 0,5 ponto percentual, para 12% ao ano.
Entre janeiro e agosto, a inflação subiu 4,42%, praticante consumindo o centro da meta, de 4,5%. A força demostrada pelas remarcações indica que, tanto neste ano quanto em 2012, o IPCA ficará distante do objetivo do governo. Entre os analistas, a percepção é de que o Banco Central aceitará que o índice oficial de preços leve mais tempo para convergir ao centro da meta, talvez só em 2013, abrindo espaço para pelo menos mais duas reduções de 0,5 ponto nas próximas reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom).
Em conversas reservadas, o presidente do BC, Alexandre Tombini, refutou tal possibilidade e assegurou que, no ano que vem, a inflação cairá para um nível próximo de 4,5%, devido, sobretudo, ao agravamento da crise internacional, que ajudará a reduzir o ritmo de crescimento do país.
Arrocho fiscal
Ontem, ao longo do dia, Tombini passou uma série de recados ao mercado e dentro do governo. Disse que o BC esperava um IPCA “ligeiramente superior” ao 0,37% registrado em agosto e que o ápice da inflação em 12 meses foi atingido no mês passado. Segundo ele, de agora em diante até abril, os índices de preços cairão sistematicamente.
O mesmo discurso foi repetido pela presidente Dilma Rousseff, que ressaltou a confiança na capacidade do BC de manter a inflação na meta e a importância da continuidade da queda dos juros.
Para isso, ela se comprometeu a manter o ajuste fiscal, apesar da desconfiança dos especialistas. Dilma destacou, inclusive, que reforçará aos aliados no Congresso o pedido para que não votem projetos que resultem em aumento das despesas.
Dados do IBGE mostram que os alimentos foram os itens que mais pesaram no orçamento das famílias. Apenas em agosto, esses produtos ficaram, na média, 0,72% mais caros e responderam por 45% do IPCA.
A carne de boi computou reajuste de 1,84% no mês e de 17,10% nos últimos 12 meses.
Para Irene Machado, técnica do IBGE, os consumidores devem se preparar, pois, com o período de entressafra começando, os preços dos alimentos continuarão subindo. Além disso, a ração do gado ficará mais cara, porque os preços do milho e da soja estão em disparada.
A cabeleireira Elisete Maria Fernandes, 45 anos, está atordoada diante da carestia e, para não ser obrigada a reduzir a quantidade de itens que vão à mesa da família, aproveita todas as promoções. “Não há outra saída. Foi assim que comprei uma peça de lagarto a R$ 10,49, que, fora da promoção, custa R$ 16,99”, explicou. Já a autônoma Maria Abadia Cunha, 49, abriu mão de renovar o guarda-roupa.
“As roupas estão cada vez mais caras”, queixou-se, coberta de razão. Com o fim das promoções de inverno e a chegada da coleção primavera-verão, os artigos de vestuário tiveram reajuste médio de 0,67% em agosto. Os preços das roupas femininas subiram 1,18% e os das masculinas, 0,75%.
A dona de casa Elisete Rodrigues, 39 anos, tomou medidas mais radicais para segurar o orçamento. “Há dois meses, não compro roupas.
Em todas as lojas que pesquiso, as peças estão acima do que posso pagar. Então, me viro com as que tenho”, disse. A dona de casa Sizue Yuri, 40, e o marido, o advogado Ramon Vam Guggenhout, 69, também tiveram uma surpresa desagradável ao pesquisar o preço da máquina de lavar.
“Nas lojas, só vemos anúncios de mais de R$1 mil. Há três meses, os valores não passavam de R$ 900”, reclamou Sizue. Pelas contas do IBGE, os eletrodomésticos ficaram, em média, 2,38% mais caros.
Para Carlos Thadeu Filho, economista da Franklin Templenton, o alívio da inflação ainda está longe de aparecer. Carlos Kawall, economista-chefe do Banco Safra, aposta em IPCA de 6,6% neste ano e de 5,20% em 2012.
Imposto adiado
O Ministério da Fazenda anunciou ontem que o governo decidiu adiar para o início de 2012 o aumento no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) incidente sobre o cigarro. A alta deveria entrar em vigor a partir de dezembro deste ano. Caso houvesse o reajuste, os economistas calculam que o IPCA daquele mês teria uma elevação adicional de 0,20 ponto percentual.
De acordo com o secretário-executivo da Fazenda, Nelson Barbosa, o governo atendeu o pedido do setor, que precisava de mais tempo para se adaptar à mudança e revisar as decisões de produção, investimentos e marketing. “O que a gente está fazendo não é só um aumento de tributação, é uma mudança no modelo”, justificou.